Brasília-DF, celeiro de grandes artistas!
INV – Nos fale um pouco sobre você
HZ – Moro no Guará II desde 73, fui confeiteiro, coralista de um grupo da igreja católica, trabalho com vários seguimentos artísticos: artes plásticas, poesia, música, etc. Montei várias bandas de rock, tocando bateria, gaita. Sou autodidata. Passei para MPB para me adaptar aos tempos, sobreviver, toquei em barzinho em shows. Faço parte de quatro coletivos de poesia e literatura: Tribo das Artes, Celeiro Literário Brasiliense Urbano e hoje mais recente Cia Arte Cum, como miolo do Boi, do Boi Jatobá em Taguatinga. Sou barítono e toco baixo quando se precisa, assim como da voz.
INV – De onde vem essa veia cultural?
HZ – Cada família tem uma veia: administrativa, médica, advocatícia, professoral etc. A minha é artística e é muito forte, meus quatro tios desenhavam, são natos, eu também nasci com essa habilidade, desenvolvo ela desde criança nas artes plásticas, na escultura, na música, uma vertente se liga na outra.
INV – Como você vê o mundo hoje?
HZ – Muitas injustiças sociais, a vida não está fácil, a gente luta para sobreviver, aplico minha arte para a luta social, e cada uma das minhas vertentes se encaixam perfeitamente, com peculiaridades. Há uma frase da Tribo das Artes que diz: “Não basta fazer arte, ela tem que incomodar”. Tudo que faço tem um cunho social, político, de denúncia para que minha expressão artística tenha objetivos, e não ser só contemplativa ou comercial. Eu comercializo porque preciso sobreviver, pinto parede, quadros por encomenda, faixas e shows.
A situação social não é bem a que queria, mas nós artistas do povo temos o compromisso que é lutarmos com arte, para que o bem-estar venha à tona: “Ser poeta e artista é trazer direitos à tona”.
Nosso país não valoriza o artista, temos que lutar bastante para ter esse reconhecimento, e não estou falando de reconhecimento comercial. Uma vez uma pessoa me falou que a melhor época para gente se firmar e sobressair é no vermelho. Mas temos que nos virar. O capitalismo é selvagem, existem muitos malas disfarçados de produtores culturais, que usam o capitalismo pra escravizar os verdadeiros artistas e produtores culturais. Os falsos produtores culturais se apropriam dos verdadeiros artistas culturais no DF, no Brasil e no mundo. São leigos até pra fazer uma pré-produção. Tenho que ensinar e capacitar, que é o papel de conselheiro cultural, nato e eterno, kkkkk . Aqui no DF somos artistas e produtores de nós mesmo. Somos marchands.
INV – Quais são as suas principais referências?
HZ – Na literatura, nas artes plásticas… Nós artistas somos polêmicos, temos nossa própria direção. Observem Jim Morrison, Miró, Tutti Fruti, Raul Seixas, Deep Purple, Jimi Hendrix foram discriminados porque lutaram contra o preconceito, Roger Waters, do Pink Floyd; vejam o exemplo, a forma como ele expressou o momento histórico em que vivia, tem até filme; respeito muito o Gil, Caetano Veloso, Jorge Mautner. Quando pego meu violão e faço blues vou lá no Celso Blues Boy, BB King, são minhas referências.
INV – Zen, o que é o Boi Jatobá?
HZ – É o festejo da cultura popular. O Boi Jatobá já existe aqui há muito tempo. Mestre Geraldo Toledo Magela é o criador, o boi já teve várias formações, mas ele escreveu as letras, tem uma banda no palco e o cortejo acontece, é uma historia como acontece no Pará, no Nordeste , a Catirina do seu José, ela esta grávida e tem um desejo, queria comer uma língua, eu quero a língua do boi, aí o boi foge pra floresta, o Zé pega e mata o boi, traz a língua pra Catirina, então, ela diz que não está mais com desejo, todos ficam com dó do boi e começam a tentar ressuscitar o boi. Algo bem místico. Assim, eles conseguem trazer de volta a vida do boi. Começa o festejo que envolve todos os que estão ali participando. É uma historia muito bonita, no palco está o sanfoneiro, o zabumbeiro, o trianguleiro o pandeirista, o instrumento de percussão e a vocalista, que a atual é Kika Moraes, ela canta o cortejo todo. São são de 10 a 8 músicas, que vão da morte à ressurreição e festejo.
INV – Deixe um recado para os jovens artistas.
HZ – Convivo com jovens que tocam muito, eles tem suas peculiaridades, assim como tínhamos quando jovem. Hoje tenho 60, sei o que é, fazer o que gosta, precisamos nos conhecer pra fazer nossa arte, buscarmos o que precisamos pra fazer melhor, nesse sentido, precisamos do respaldo de nossos pais, do estado. No passado encontramos muitos percalços, porque a arte ainda era marginalizada, não dava dinheiro, isso, aquilo… é melhor ser médico, falavam. Mas se nascemos artista, é melhor continuarmos. Hoje se sou um artista e vivo disso agradeço a minha mãe, pois ela me permitiu, não tentou me desviar do que eu queria, dona Francisca, Dona Pretinha, muita gente gosta dela, eu sempre quis isso, com dinheiro ou sem dinheiro, meu sustento é a arte. O que fazemos, nos dar sustento e realização. E é isso que os jovens devem buscar.
Os Brasilienses poderão conhecer melhor o trabalho desse mult artista popular, ele é um artista confirmado para se apresentar no II Seminário de lutas Contra o Neoliberalismo – Guerra e Paz, que ocorrerá na UNB no dia 23 de Outubro.
Lúcia Araújo
Osmarina Portal
Sucursal DF