Os Rumos da Sucessão Presidencial no Brasil

Neste novo entreato na conjuntura internacional, de crise do capital e guerras, a temática nacional que se desenvolve refletindo este processo vem à tona e assalta a cena histórica através da sucessão presidencial. Embora a luta pela sucessão tenha se iniciado, precocemente, com a crise política no Senado (entre PFL de Antônio Carlos Magalhães, versus o PMDB de Jader Barbalho) e acelerado com a crise energética, no ano passado, somente agora, com a definição dos candidatos a Presidência da República é que se pode analisar com maior profundidade este fato e avançar na compreensão do seu significado real para o Brasil dentro do atual contexto internacional. Em tese, isto é possível a partir da concentração da sucessão em apenas quatro candidaturas - Luís Inácio Lula da Silva, pelo PT; José Serra, pelo PSDB-PMDB; Ciro Gomes, pelo PPS-PDT-PTB; e Anthony Mateus, Garotinho, pelo PSB –, pois são em torno destas que os diversos grupos e segmentos das classes sociais estão se aglutinando e delineando o perfil de demandas e possibilidades de realizações do próximo governo.

Claro que até iniciar oficialmente a partida, segundo as regras eleitorais e interpretações em execução pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), muita água pode rolar por baixo da ponte. É o que se deduz da pressão do PFL contra a candidatura de José Serra, os impasses na base trabalhista de sustentação de Ciro Gomes (entre o PPS e o PDT); e ao par disso, o isolamento da candidatura Garotinho, que acabou caindo nos braços dos ex-funcionários do SNI (dos tempos da ditadura militar no Brasil). Neste sentido é possível que o quadro ainda possa se alterar concentrando ainda mais a preferência do eleitorado, logo, dos grupos e articulações políticas. Hoje, quem olhe, desapaixonadamente, para este processo, encontrará na candidatura Lula, o setor mais conseqüente e bem estruturado para o que se propõe: administrar a crise do capital no Brasil com base em política econômica e social distinta da que se fundamenta no neoliberalismo e vem sendo aplicada, sistematicamente, pelas oligarquias no país.

Antes porém de passarmos a uma rápida avaliação do papel que desempenham estas candidaturas dentro da situação nacional, é preciso registrar que no atual quadro de candidatos, não há um sequer que se possa considerar uma velha liderança oligárquica, como aquelas que até a década de 80 (Sarney, ACM, etc.), dirigiam a política do país. Isto quer dizer que existe uma renovação destas lideranças políticas na sociedade, iniciada com Collor de Melo e continuada com Fernando Henrique Cardoso, durante toda a década de 90; Lula, Ciro, Serra, Garotinho, são quadros que despontaram politicamente na década de 80 e 90, embora alguns tenham iniciado a vida política até mesmo antes do Golpe Militar de 64, como foi o caso de Serra. Mas aqui é válido, mais uma vez, relembrar que se as velhas lideranças burguesas não se fazem presentes diretamente neste processo sucessório, como candidatos, isto não significa dizer que não tenham forças ou que não estejam tramando esta participação (vejam a oposição cerrada do PFL contra Serra); ou muito menos, que não encontrem abrigo seguro em algumas candidaturas. Para verificar isto basta se considerar o namoro de Lula (PT) com o Senador José de Alencar (PL); Ciro com o PTB e o PFL de ACM; Serra e a oligarquia paulista e PMDB; e o Sr. Garotinho com a Firjan e o SNI.

Neste sentido, é bastante clara a relação de representatividade entre as candidaturas do PT, PPS, PSDB e PSB, tanto com as oligarquias burguesas, e o mesmo se pode dizer também com relação aos segmentos intermediários (camadas médias) entre as duas classes principais da sociedade (burgueses e proletários). Contudo, se podemos deduzir este processo de representatividade pela notória aglutinação destes segmentos sociais mais em torno desta que daquela candidatura, já não se pode dizer o mesmo da classe operária. Aqui, mesmo sofrendo com o processo de divisão sindical e até mesmo da falta de “consciência de classe”, no sentido marxista do termo, a representação é direta e incontestável, a candidatura Lula é representante legítima dos trabalhadores brasileiros e seu Partido, é o que mais tem respaldo e trabalho junto a classe operária. Portanto, a grande novidade na política nacional é que a renovação das lideranças políticas colocaram as oligarquias sem uma representação mais confiável, como é o caso das velhas lideranças oligárquicas burguesas, por isso manobram ainda para uma participação direta no processo ou para se acomodarem bem em torno de um novo representante de sua classe. Tudo aqui cheira, dependendo do resultado eleitoral, para uma aventura golpista.

Quem entre os quatro candidatos mais viáveis, no momento atual, poderia expressar interesses de classe que una as oligarquias burguesas? Esta indagação não é tão simples de responder, pois aqui, embora pese a origem de classe ou a “classe em si”, na verdade o que contará é a proposta que mais desperte o consenso entre a burguesia. E neste sentido, vale apenas demonstrar que em ambos programas ou idéias de programas esboçados pelos candidatos no debate com a CNI (Confederação Nacional da Indústria), realizado no dia 09 de maio, todos foram categóricos em afirmar que as “conquistas do real” (plano de estabilidade da moeda) são intocáveis. E que a base de suas políticas econômicas se destinarão, única e exclusivamente, apesar da retórica de alguns, a ajustarem as relações jurídicas e políticas da sociedade à base atual da economia, reduzida pelo “Plano Real” a uma grosseira dependência da poupança externa, com deficiência de infra-estrutura e grave dependência tecnológica (mão-de-obra técnica e equipamentos) e sobretudo de mercado, já que a exportação é um elemento consensual como saída para esta grave situação nacional, denunciada por todos os candidatos. Portanto, tendo por centralidade de Plano de Governo ou programa de governo a estabilidade da moeda, todos se propõem a ajustarem o restante da sociedade aos paradigmas neoliberais que atualmente presidem a economia nacional.

Assim, um a um dos candidatos versam sobre a “reforma tributária”; reforma da CLT, “negociação das dívidas internas e externas”; política externa agressiva (ousada); reforma agrária; como bases para o “crescimento econômico”. Nenhum deles pensa sequer em tocar no poder dos monopólios privados dentro do país, que condenam a economia nacional a um papel pífio ao nível mundial. Nenhum deles tocou sequer nas relações com o capital financeiro, visto que tomam por princípio a estabilidade da moeda nacional que repousa única e exclusivamente na relação servil com o FMI e a banca internacional, impondo as políticas sociais e históricas atribuições do Estado como seguridade social, segurança, educação e saúde, “a morte vida severina” de cada dia, nos sertões e favelas do país. Aqui toda a diferença entre populistas e não populistas se resume a utilização ou não de “políticas compensatórias”, a la “Cheque Cidadão do Garotinho”; ou “Bolsa Escola de FHC e PT”. Nada aqui é visto como fenômeno russo, ou seja, uma análise teórica equivocada que afirma que a concentração de capital no campo e cidade destruiam o mercado interno, logo a necessidade de uma etapa democrática burguesa e capitalista, fundamentando assim uma ação política aventureira que levava as massas a ilusão de que era possível saltar do feudalismo ao socialismo. Aqui, Garotinho tem certa razão ao reclamar da pecha de populista porque usa políticas compensatórias, e está certo, sua alcunha deveria ser clientelista ou demagogo, como qualificou Cícero, no Antigo Império Romano - a política do “Pão e Circo”.

Nestes termos, as diferenciações políticas não estão nas proposições de governo, mesmo havendo uma linha crítica entre Serra e os demais candidatos, já que este assume o continuísmo de FHC e os outros, Lula, Ciro e Garotinho, nas palavras, se colocam na oposição ao governo. Aqui toda retórica oposicionista apenas se diferencia da situação no modo de gerenciar as bases a que chegou a economia e a sociedade, sob a política econômica neoliberal enquadrando a globalização do modo de vida dos EUA. Nenhum dos candidatos, e aqui é importante repetir, indicou uma linha de ruptura com o modelo econômico vigente, nenhum deles é capaz de sustentar as idéias Keynesianas, o que reveria de forma contundente tudo o que FHC e Cia fizeram, como foram os casos das privatizações criminosas da Vale do Rio Doce, da Usiminas, Cia Siderúrgica Nacional, Telecomunicações, Hidroelétricas e etc. Não! Entre os candidatos atuais não existe nada parecido com isso. Neste aspecto toda a diferença entre uma e outra candidatura está nas bases sociais que a sustentam para dar continuidade a esta política econômica neoliberal, sem nenhuma mudança de rota ou rumo. Pois na lista de venalidade ainda restam a Petrobrás, Banco do Brasil, Caixa Econômica, Furnas, Base de Alcântara e etc. O que nos deixaria eternamente de joelhos frente ao imperialismo e as oligarquias.

Tendo em vista este aspecto, a candidatura que mais provoca temor ao imperialismo e às velhas oligarquias no país, é a de Lula. Não por suas idéias ou consciência de classe, do ponto de vista marxista, que é nenhuma, Lula continua, como dizia o imorredouro comunista revolucionário e herói nacional Luiz Calos Prestes, um político empírico, age por sentimentos, o que é passível de indução à erros e acertos. O bom senso, nem sempre é um critério objetivo. Contudo, devido a sua base social, a classe operária e o sofrimento cada vez maior do povo, que parece que nestas eleições está disposto a externalizar este sentimento através do voto contrário ao governo, e em Lula, é o que mais tem bases objetivas para impedir este rumo de destruição do país e atender minimamente as demandas sociais. Sem ilusões com mudanças radicais ou revoluções. Aqui o processo se reduz a uma administração da crise do capital, de forma sensível a soberania nacional e a miséria e luta das massas. E mesmo assim, o governo Lula causará um enfrentamento histórico com o imperialismo, talvez em dimensão superior ao do governo de João Goulart, pelas razões já expostas anteriormente: por aquilo que deixará de fazer a favor do imperialismo.

Para se concluir este fato, basta observar que a Crise Geral do Capital, continua se agravando internacionalmente, em especial nos EUA, e que este processo tem exigido mais e mais a guerra imperialista como saída histórica, o que torna os planos e estratégias de guerras o centro diretor da economia dos países beligerantes. E quando se fala dos EUA, cerca de 1/3 da economia mundial, fala-se de economia mundial. Deste modo, não enxergar nos propósitos dos americanos para a América do Sul, uma estratégia para se assenhorar de reservas hídricas e minerais, biodiversidade, e mercado em regiões geoestratégicas, como são os casos do Bacia do Prata e Amazônia, seria uma profunda estupidez. Quem não veja na idéia de escudo invisível a saída americana para a Crise do Capital, através da guerra, e neste contexto o papel do Brasil como fornecedor da logística a este projeto, não entenderá porque a candidatura Lula incomoda o mercado financeiro, propiciando o movimento especulativo a cada pesquisa eleitoral e a chantagem que tal movimento passa a exercer sobre as oligarquias dominantes. Quem financia o projeto Guerra nas Estrelas, não são somente as sete irmãs do Petróleo e ou a indústria militar, mas sobretudo o capital financeiro. Portanto, nada demais que tal processo comece a se explicitar na política nacional. Resta saber para qual das candidaturas concorrerá o consenso das oligarquias; se não for Serra, Ciro ou Garotinho, haveria uma carta na manga do paletó? Seria Aécio Neves?

Neste contexto é que todos os Comunistas Revolucionários devem lutar pela unidade em torno de uma Plataforma Comunista, o jogo é pesado, pois quem teria boa vontade com pequenos grupos de revolucionários quanto se tem a classe operária nas mãos? Por que ir em frente na defesa do povo se não existe dentro deste povo uma só força que possa levantá-lo contra eu??/? Eis o desafio que se coloca com a possível vitória de Lula, se ao contrário de nos unirmos e construirmos uma ferramenta para nossa ação conjunta, nos dispersarmos em negociatas e tentativas de abocanhar as migalhas da festa, à nós soçobrará a vergonha de deixar a classe operária e o povo pobre, em nosso país, refém de uma conjuntura que poderá repetir 1964; e como toda boa repetição, tudo não passará de farsa. Assim, conclamamos uma vez mais, todos a se unirem em torno da Plataforma Comunista para o Brasil, construir este instrumento de luta em todo o país e participar do processo eleitoral levando as idéias reais de ruptura com o imperialismo e capitalismo, como único caminho de liberdade, justiça social e de soberania de nosso povo: a revolução social e um governo de transição para o comunismo.

Abaixo os demagogos e clientelistas! Abaixo o continuísmo de FHC! Viva PCML e a Revolução Brasileira! Proletários de todos os países: Uni-vos!

Rio de Janeiro, 09 de maio de 2002

P. I. Bvilla Pelo OC do PCML