Lula e os Trezentos Picaretas

 

O presidente Luis Inácio Lula da Silva não quer vincular seu governo aos “Trezentos Picaretas”, do presidente da Câmara Federal, Severino Cavalcante, mas não tem como escapar desta. É claro que ele pode postergar a celebração oficial dessa aliança, considerada por muitos de seus correligionários de espúria, através da utilização de fatos que ajudem uma encenação de que não haverá reforma. Trata-se não mais que jogo de cena para ganhar tempo, porém, cedo ou tarde, terá que anunciá-la publicamente e entregar uma pasta ministerial ao PP (Partido Progressista, de Severino Cavalcante, Delfim Neto e Paulo Maluf), que há muito faz parte da base aliada no Congresso. E esta previsão é tão verdadeira quanto a decisão da cúpula do PT (Partido dos Trabalhadores) em reeleger Lula por mais 4 anos, como se tornou evidente no discurso do Ministro da Casa Civil, José Dirceu, durante as comemorações oficiais dos 25 anos do PT. Como diziam os romanos: “Quem viver verá”!

Naturalmente, a questão da reforma ministerial é uma necessidade mais que iminente do governo Lula. Tendo em vista o resultado das eleições municipais, em que seus aliados (PMDB, PSB) e a oposição (PSDB, PFL) ganharam espaços importantes, negar esta realidade seria um erro tático absurdo para quem quer se reeleger; seria como dar um tiro no próprio pé, pois eqüivale oferecer à oposição não apenas os instrumentos de obstrução das propostas de governo, mas, sobretudo, uma tribuna privilegiada para ecoar aos quatro cantos todas as derrapagens do Planalto, sem contar que empurraria um significativo contingente de congressistas para os braços da oposição da nova (PSDB) e velha (PFL) oligarquia burguesa. Portanto, politicamente, Lula não tem saída, e não vai demorar muito para anunciar definitivamente o restante da reforma, vencendo todas as resistências dentro e fora do PT.

Não é difícil compreender por que Lula faz tanta encenação na atual conjuntura, pois, quem acompanhou de perto as comemorações dos 25 anos do PT, certamente, observou que duas comemorações se efetuaram paralelamente, uma em Pernambuco, puxada pelo governo e comandada por Dirceu e Cia, e outra em São Paulo, onde se reunia a histórica esquerda petista, que, como sempre, ameaça, ameaça, ameaça e no final acaba pegando um “cargozinho” aqui outro ali e assim vai vivendo. Sem dúvida é uma tática muito “inovadora”, como diz aquela máxima popular do: “nem ´desce` e nem sai de cima”. Contudo, para a cúpula petista é um mal necessário, pois é grupo que ainda dá uma coloração, embora muito desbotada, ideológica de esquerda ao partido, quiçá ao governo. Portanto, postergar a reforma e tentar mascará-la com encenações pueris é apenas uma tática pertinente aos dirigentes petistas que pegam no contra-pé da oposição interna, devido ao seu temor pela ruptura e perda de legenda (pois como toda esquerda reformista e legalista, adora o voto e a demagogia, logo, não gosta de ficar mal na fita).

O que se tem de bom em todo este processo é a reação do ministro da Saúde, Humberto Costa, que para não sair do governo pela porta dos fundos, já que sua gestão mais que um mar de incompetência primou pela desorganização do que restava da estrutura de saúde no país, resolveu acabar com a farra do banqueiro Ronaldo Cezar Coelho, na Secretaria de Saúde da Prefeitura do Rio de Janeiro. Com isto, além de desmascarar a trama do banqueiro que desviava o dinheiro da Saúde para aplicações bancárias, com fins certamente eleitorais, que levou à crise de calamidade a estrutura de saúde do maior município do estado do Rio de Janeiro, atingindo perto de 11 a 12 milhões de pessoas (todo o Grande Rio), também acertou uma paulada nas pretensões do atual prefeito César Maia, que já se salientava na campanha para o governo do estado, aproveitando-se da gestão medíocre da Srª Garotinho (hoje PMDB), seu principal desafeto. A ação de Humberto Costa foi contundente e é apoiada, mesmo pelos que discordam e o criticam no Ministério, porque além de toda encenação que representa uma intervenção federal na Prefeitura, retirou do prefeito César Maia o discurso reacionário e demagógico de exigir o Exército nas ruas para cumprir o papel de polícia e reprimir as favelas, reduzindo a dimensão e importância desta instituição no Estado, de força principal à força auxiliar. A intervenção deu uma nova dimensão ao papel das Forças Armadas, um papel social extremamente popular e digno, como já faz em regiões ermas do país, na prestação de serviço de saúde.

Por outro lado, sabe-se que tudo não passa de grande encenação, mas, de qualquer forma, coloca uma contradição bem nos planos dos reacionários no país e no continente, da Patagônia ao Rio Bravo, estabelecendo um certo sentido vazio às denúncias de que as FARC-EP (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo) haviam financiado a campanha do PT. E ainda, o discurso escatológico de Rumsfeld e do ministro da Defesa, José de Alencar, sobre a arquimanjada idéia da ligação das FARC ao narcotráfico. Sem dúvida, é uma combinação explosiva o encontro e acertos estratégicos entre “o mestre da tortura em Abu Ghraib e o burguês empresário demagogo”; mas, até que ponto é ainda possível manipular a cabeça dos jovens oficiais das Forças Armadas, e mesmo de escolados generais, das boas intenções norte-americanas e dos oligarcas reacionários do país, através de surrado discurso de “guerrilha e narcotráfico”? Pelo entusiasmo com que os militares abraçaram a causa da saúde pública no município do Rio de Janeiro, a presteza e dinamismo de ação, pode ser que as coisas tenham mudado mais do que se imagina nesta instituição: pontos para Humberto Costa, mas até quando?

Abaixo a aliança espúria entre Lula e os Trezentos Picaretas!
Fora com César Maia e seus banqueiros da Saúde!
Fora com os Rumsfeld e o imperialismo!
Viva as FARC-EP e a luta revolucionária do povo colombiano!
Viva o Partido Comunista Marxista-Leninista!


Rio de Janeiro, 24 de março de 2005   P.I. Bvilla, pelo OC do PCML