Ciclone Idai e o descaso internacional com Moçambique
Na semana do dia 14 de março, o sudeste do continente africano presenciou um dos maiores desastres climáticos e humanitários desde os anos 2000. O ciclone Idai, com ventos de até 177km/h, atingiu países como o Zimbábue, Malawi e o mais afetado, Moçambique, principalmente na província de Sofala, onde está localizada a cidade da Beira, a segunda maior cidade do país, composta por 500 mil habitantes, que teve devastado quase 90% do seu território.
O litoral moçambicano frequentemente é atingido por ciclones de baixa magnitude, entretanto, o Idai foi o mais forte das últimas décadas, devastando cerca de 11 mil casas, mais de 39 centros médicos e afetando mais de 2,9 mil escolas e plantios da região, segundo os dados da UNICEF. Após duas semanas do desastre, algumas escolas retornaram às aulas, mesmo em condições precárias, como sem a parte superior, sem livros e com falta de profissionais, que também foram atingidos pelo ciclone.
Segundo moradores de várias regiões do país, a cidade ficou sem nenhum tipo de comunicação, sem energia, e a estrada principal ficou, durante horas, completamente fechada, sem que pudesse chegar ajuda. O presidente moçambicano Filipe Nyusi decretou na terça-feira, dia 19, estado de emergência e situação de risco para mais de 350 mil pessoas. Graça Machel, presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade, falou no sábado, 23, que os recursos e a assistência serão insuficientes, pois o número de vítimas não parava de subir, só em Moçambique, uma semana depois, já haviam registrado 417 mortos. Enquanto no Zimbábue já tinham sido contabilizados, em média, um pouco mais de 269, e no Malawi 56 vítimas aproximadamente. Até as últimas informações divulgadas pelas redes de comunicação local, no dia 6 de abril, o número de vítimas fatais teria aumentado para 602.
Na cidade da Beira, imagens aéreas mostraram que pessoas esperavam ajuda em cima de árvores e construções, pois a maior parte da cidade, como aldeias, ficaram submersas e os casos de cólera e malária começaram a ser detectados na região. O governo cubano se prontificou e enviou cerca de 280 médicos e brigadas para auxiliar nos cuidados de saúde das vítimas, enquanto Portugal está enviando mantimentos para a população. Segundo relatos do biólogo e escritor conterrâneo da Beira, Mia Couto, o governo brasileiro foi o que menos contribuiu para reconstrução da cidade atingida pelo ciclone, demonstrando-se decepcionado pelo fato de terem grandes laços de amizade e pelo Brasil ter uma situação econômica muito melhor que a maioria dos países que contribuíram com um valor superior.
E mesmo constatando a enorme perda material e humana, a imprensa internacional está abafando criteriosamente o desastre, sendo tendenciosa e oportunista, pois pouco se fala que a ajuda não está chegando às comunidades rurais, concentrando-se apenas em alguns pontos da cidade da Beira e nos vilarejos.
Beatriz Morais
Geógrafa, formada pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, estudou durante 1 ano em Moçambique através do Programa Ciências Sem Fronteiras.