Alca: divergências são antagônicas
Alca: divergências são antagônicas
Por: Márcia Silva
A reunião de cúpula entre os 34 países da América que se propõem a formalizar uma área de livre comércio no continente (a ALCA) teve como decisão principal a definição do prazo de janeiro de 2005 como data limite para o término das negociações e dezembro do mesmo ano o início de sua implantação. Mas este não era o maior problema para a constituição do bloco.
As divergências, que estão ficando mais claras a cada cúpula, se revelam cada vez mais como antagônicas. Os Estados Unidos são os mais interessados na ALCA, porque precisam resolver sua crise econômica para manterem-se na hegemonia do sistema capitalista diante do crescimento da UE; falam em mercado livre nas Américas, mas são os que mais desrespeitam as leis de livre mercado, mantendo uma forte política protecionista de sua economia. Daí a pergunta que os países pobres das Américas se fazem é a seguinte: ALCA para quem? Eis algumas questões as quais os Estados Unidos não querem resolver:
Barreiras alfandegárias - os EUA têm medidas (altas taxas) para proteger seus produtores. Exemplo: o suco de laranja e o aço brasileiros são barrados no mercado americano por altas taxas de importação.
Subsídios agrícolas - os EUA e UE subvencionam os agricultores locais para baratearem seus custos, fazendo com que estes controlem artificialmente os mercados locais, e exportem com preços mais baixos. Assim não deixam os países pobres, exportadores de produtos primários, venderem com iguais condições.
Regras sanitárias distorcidas - alegam riscos sanitários para não importarem produtos primários dos países pobres.
Patentes - os Estados Unidos e a UE protegem a propriedade intelectual não permitindo que outros povos venham a ter desenvolvimento tecnológico e se mantenham eternamente dependentes do “lixo ocidental”.
Leis Antidumping - os Estados Unidos não têm regras claras que garantam que suas empresas não venham praticar o dumping, ou seja, vender abaixo do custo e usam leis para antidumping sobre-taxando produtos para impedir o acesso a seus mercados.
FHC faz discurso eleitoreiro
O
discurso do presidente FHC deixou constrangidos os principais
articuladores do encontro, os Estados Unidos. Foi um discurso
politicamente correto, batendo na principal ferida dos soberbos
americanos: a revolução
cubana, atravessada na garganta desse país imperialista,
principalmente quando Cuba comemora 40
anos de vitória
sobre os invasores
ianques na heróica batalha da Playa Gyron.
FHC, chamando Cuba de povo irmão, reivindicou a participação da ilha socialista de Fidel no novo bloco em formação. O que é inaceitável para os EUA.
Se FHC visou ganhar tempo e simpatia diante da crise de seu governo e das eleições presidenciais no Brasil, ou se ele realmente irá do discurso e à prática até as últimas conseqüências (pois não estará no governo no fim das negociações), ele recebeu elogios por abordar algumas questões de fundo que ficaram explícitas, demarcando o terreno onde se dará a batalha.
As articulações antes do encontro foram fundamentais para reforçar o discurso de FHC. Ele conversou com De la Rua horas antes de se pronunciar na abertura, cobrando as declarações de Cavallo na mídia internacional contra o Mercosul. De la Rua fez questão de desmentir, enfatizando o compromisso com o Mercosul.
Hugo Chávez assina acordo com reserva
Na
Declaração de Quebec, documento assinado pelos 34
países presentes na cúpula, a Venezuela se destacou por
apresentar três ressalvas de fundo quanto aos pontos aprovados,
onde as suas propostas foram derrotadas.
- Sobre as formas de democracia no continente, o presidente Hugo Chávez defendeu a inclusão do adjetivo “participativa”;
- Chávez pediu também a retirada da expressão “ até no máximo 2005”, explicitando o momento em que a Alca passaria a entrar em funcionamento. Argumentou que era incoerência aprovar essa redação, se o que ficou acertado é que este seria o ano do fim das negociações - e se estas fracassarem?
- O último destaque afirmava que a ALCA deveria levar em conta as diferenças entre as nações. As desigualdades sociais e as questões trabalhistas não foram sequer mencionadas.