Sobre o segundo turno das eleições e a Crise do Capital

 

Como já era previsto por todos, inclusive pela própria imprensa burguesa que chegou a anunciar a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva no 1º turno, a oposição ao governo das oligarquias como um todo (Lula, Ciro e Garotinho) conquistou uma esmagadora maioria de votos, cerca de 76%, nas eleições presidenciais: Lula obteve 46,44%; Garotinho,18% e Ciro, 12% dos votos. Sem dúvida, esta votação expressou o sentimento da população em relação ao governo FHC e seu candidato oficial, o Sr. José Serra, que obteve apenas 23%, a metade dos votos de Lula, e só vai para o 2º turno das eleições devido aos votos dados a Ciro e Garotinho. O mérito de Serra chegar ao 2º turno das eleições é igual ao do candidato eleito pelo “Prona”, em São Paulo, para o Congresso Nacional, com apenas 280 votos. Na verdade, ele foi eleito pelos votos dados ao Sr. Enéas Carneiro para Deputado Federal, cerca de um milhão e setecentos mil. Portanto, essa história que ele anda contando de que “o povo o colocou no 2º turno porque quer debate” não passa de uma grande piada.

Quem não esperava este desempenho da oposição ficou surpreendido. De modo geral, a oposição cresceu para cerca de um terço dos membros do Senado e Câmara Federal; elegeu 7 dos 12 governos estaduais eleitos no 1º turno (PT- 2, PSB-3, PPS-2) e disputa o governo em mais 8 estados dos 15 em 2º turno. Sem dúvida, não fará a maioria dos governos estaduais e, muito menos, das Assembléias Legislativas, em todo o país, a exemplo do Senado e Câmara Federais, mas é inquestionável que se tratou de uma vitória expressiva da oposição contra o governo das oligarquias. Aqui não há espaço para manobra, o povo disse não ao neoliberalismo e cravou uma espada no peito do FMI e da ALCA, melhor dizendo, dos EUA. É claro que houve manobra e que não se pode dizer que toda a oposição seja oposição de verdade, como é o caso do Sr. Garotinho e até mesmo Ciro Gomes, que até ontem comia no prato de FHC. E graças a esta manobra, as oligarquias conseguiram seu maior intento diante da tendência eleitoral que apontava para a vitória de Lula no primeiro turno, que foi, de certa forma, inflar os votos do Sr. Garotinho no Rio de Janeiro; bom, cedo ou tarde esta história virá à tona (essa história de Garotinho dizer que pediria a impugnação das eleições no estado em função das urnas eletrônicas de 1996, caso o número de votantes fosse menor que o número de inscritos no Tribunal Eleitoral, cheira àquela máxima do ladrão na feira que na iminência de ser pego em flagrante, começa a correr e gritar: “Pega ladrão! Pega ladrão!”).

Mas o importante deste processo foi que com base nesta manobra as oligarquias conseguiram evitar a vitória esmagadora de Lula no 1º turno, retirando desta feita uma ampla base de legitimidade e autoridade para seu governo implementar reformas gerais no país, tornando sua vitória mais desgastante e seu governo sujeito a negociações fora do arco de alianças da oposição. E isto é tão mais evidente quanto a tese de que o “PSDB está mais próximo do PT do que do PFL”. Quem pensar que isto é conversa, que procure imaginar o que é governar São Paulo ou Minas Gerais sem o governo federal ou vice-versa! Mas há uma outra situação política colocada e que favorece ao sistema, com o 2º turno: é a hipótese de que a vitória de Lula no 1º turno “conduziria o país a uma conjuntura similar à vivida por João Goulart após o plebiscito de 1963”. Naquele momento, o movimento pelas reformas de base, defendidas pelo presidente, ganhou a força do voto majoritário da população, elevando o conflito com as oligarquias contra-reformas, a níveis de uma crise revolucionária. O “The end” do filme nós vimos: “o golpe de 1964”. Naturalmente, naquela conjuntura, o mundo era outro: a “Guerra Fria”, que era pedra angular para a “Geopolítica” de Golbery, colocava as instituições militares do lado dos “Contras”.

Hoje a história seria totalmente diferente; ninguém mais vê o comunismo como o “bicho-papão”, mas ao contrário, hoje o “bicho-papão” são justamente os EUA, aquele que se rotulava “campeão das liberdades”. Seu sistema de opressão e exploração imperial é tão terrível que ninguém em sã consciência se deixaria enganar novamente. Suas expedições punitivas ao Iraque, Afeganistão e Iugoslávia são exemplos concretos de que não aceitam a divisão dos lucros ou sequer parcerias com um certo grau de autonomia, dentro do próprio sistema capitalista. Os EUA só reconhecem uma língua, a da força, por isso ainda respeitam a França, Rússia e China e temem os arsenais nucleares da Índia e Paquistão. Fora disso, o resto não passa de resto, que vale o peso do mercado e das fontes de matérias-primas: eis a razão do porquê ainda não invadiram de vez a Amazônia e se apoderaram de nossa biodiversidade e recursos hídricos, minerais e vegetais. Uma guerra na Amazônia, no mundo atual, tem que levar em consideração uma variável de significado estratégico: a ecologia e a biodiversidade no planeta. Pode-se comprovar ainda este fato pelo seu Plano de Guerra e ocupação militar para esta região: o Plano Colômbia. Nele, o emprego de germes e fungos é localizado e em escala ainda limitada, nada como as bombas de Napalm e o agente laranja empregado no Vietnã.

Mas o fundo da questão é que um novo impasse como o de 1964, nos dias atuais tudo poderia sair ao contrário. Desta vez as Forças Armadas é que estariam do lado das Reformas e não dos “Contras”. Veja o exemplo de José Sarney e Antônio Carlos Magalhães, homens que foram do cerne político civil dos governos militares? E mais, vejam o recado que o povo deu nas urnas desautorizando a “direita raivosa e clientelista”, em todos os Estados: Maluf, em São Paulo; César Maia, no Rio de Janeiro, etc? Portanto, para as oligarquias e o imperialismo, nada melhor que este 2º turno, pois ele significa “saia justa” no governo da oposição (Lula e no PT e aliados). Quanto ao “debate” que o Sr. Serra e Cia procuram realizar desesperadamente nesta segunda campanha eleitoral, inventando estatísticas e atribuindo significado particular ao fenômeno eleitoral, nada mais ridículo que tentar demonstrar o que o povo já está “careca” de saber: “que ele tem mais preparo intelectual e sabe expor melhor suas idéias para o público universitário e os empresários”. E não existe nada mais maçante, enjoativo e irritante que uma pessoa chata que fica querendo porque querendo te enfiar goela abaixo aquilo que não se quer. Será que o Sr. Serra e Cia não se atentaram que o povo votou contra ele e a favor de Lula justamente por isso? Será que o Sr. Serra não sabe que ele é apenas uma réplica mal acabada de FHC e que falar a língua dos empresários, dos especuladores internacionais, do FMI, da ALCA, dos EUA, não é falar a língua do Brasil e dos brasileiros (falo aqui dos interesses do povo brasileiro)? Quem parar e pensar bem compreenderá que o povo vota em Lula porque cansou dos 8 anos de governo e discurso engomado dos “Chicago Boy’s”.
Contudo, neste final de reta é preciso se atentar para dois aspectos que podem se tornar bastante explorados pelas oligarquias: o terrorismo do banditismo e o terrorismo financeiro. No primeiro caso, o terrorismo do banditismo tem os seus efeitos no plano internacional dada a onda “do terror desencadeada pelos EUA” depois do atentado de 11 de Setembro (o ataque ao Pentágono e World Trade Center). Considerando o desespero das oligarquias em cada fato para mudar a opinião das massas, não se pode descartar esta variável. Cid Benjamin, um jornalista sério e militante, em um artigo da grande imprensa, denunciou a articulação golpista na Venezuela contra Hugo Chávez para tentar influir nas eleições no Brasil. No segundo caso, as oligarquias não têm mais como esconder: ela utiliza o manto da crise do capital, que é um fato, para suas manobras cambiais e com os títulos da dívida pública, dando curso à farra do dólar e taxas de juros. Com isto, visa deixar o máximo de vantagens para os banqueiros e especuladores, já que não conseguiu impor um regime financeiro independente do governo e muito menos arrancar um compromisso de Lula em manter Armínio Fraga ou a equipe econômica do atual governo. Assim, vão continuar a pressionar e aterrorizar até as eleições. Para quem tem títulos da dívida pública é uma operação de alto risco, pois se por um lado, a alta do dólar obriga o governo a negociar em desvantagem; por outro lado, acordos arrancados ou dívidas contraídas sob estas circunstâncias têm pouca legitimidade; portanto, o que define a moratória de amanhã são as ações oportunistas e trambiqueiras de hoje.

A eleição de Lula parece um fato inevitável, mas melhor prevenir que remediar. Nossa tarefa é defender a eleição de Lula no 2º turno e difundir a “Plataforma Comunista”. Pois sabemos que apesar do sentido geral desta vitória da oposição, que já havíamos anunciado desde a “Crise na Ásia”, que é de mudança, a base para que esta aconteça sob um governo de Lula, mesmo se restrita apenas a reformas, esbarra no limite da legitimidade e autoridade dentro do sistema, coisas que são negadas de forma abrumadora com a eleição se definindo no 2º turno. E justamente por isso, a tese de união dos comunistas revolucionários através de uma Plataforma Comunista e criação de um pólo real de força em um Governo de Lula, mais que uma bandeira de luta, é uma proposta viável e necessária. Sendo assim, conclamamos todos a unir forças neste 2º turno e eleger Lula presidente; lutar e denunciar as manobras das oligarquias; e, fundamentalmente, conversar e buscar os comunistas revolucionários para debater e construir a unidade através de uma Plataforma Comunista.

Todos à luta!
Queremos saudar aqui todos os candidatos apoiados
pelo PCML no país, eleitos e não eleitos.
A luta é o que a gente faz dela!
Viva a RevViva o Partido Comunista Marxista-Leninista!
Viva a Revolução Proletária!

Rio de Janeiro, 16 de outubro de 2002

P. I. Bvilla, pelo OC do PCML