Vamos bater lata? (a campanha eleitoral já começou)

Aos poucos, a crise do setor elétrico e a renúncia de ACM e Arruda ao Senado vão se configurando num ponto de inflexão no processo político nacional. Em primeiro lugar, porque a partir de ambos os acontecimentos, emergiu a luta subterrânea ao domínio público pela hegemonia do governo e conseqüente sucessão presidencial. Em segundo lugar, porque ambos os acontecimentos se converteram também nos elementos principais do processo político atual: na bandeira de luta principal da oposição ao governo FHC e na principal contradição política da sociedade oficial, desencadeando toda a campanha pela sucessão presidencial antes do período convencionado. Em terceiro lugar, porque o binômio crise energética e sucessão presidencial, ao presidir a conjuntura política nacional, estabelece o cabresto do processo eleitoral burguês à luta de classes, ensejando assim consecutivamente a emergência da contradição fundamental da sociedade, entre o capital e o trabalho, proletariado e burguesia, empurrando a classe operária e as massas em geral para movimentos de ruptura total com a sociedade burguesa e suas instituições e lideranças.

 

Muitos camaradas seguramente questionarão nosso ponto de vista sobre o significado de tais acontecimentos para a luta de classes na sociedade; as limitações impostas pelo quadro político atual, dominado pelo processo eleitoral burguês e as contradições que emergem na mesma. Naturalmente, que a maioria dos questionamentos se fundamentam na concepção do processo político eleitoral burguês como uma forma, ou a principal forma, de manifestação da luta de classes, portanto não estando em contradição com esta última, mas pelo contrário combinando com a mesma no sentido histórico. Sem dúvida, tal argumento não está em contradição lógica com os conceitos genéricos da luta de classes e do processo eleitoral burguês. Isto porque em tese a luta de classes se manifesta principalmente na forma política, o que não quer dizer que toda luta política seja uma luta de classes, ou vice-versa. Se assim não fosse, o que dizer do boicote bolchevique às eleições burguesas em 1905, na Rússia? Ora, o boicote às eleições burguesas foi sobretudo uma luta política de conteúdo revolucionário em oposição à luta política de conteúdo reacionário contida no processo eleitoral tzarista. Do mesmo modo pode-se argüir o exemplo da greve geral de massas como forma de luta política revolucionária em contradição à sua concepção genérica de luta eminentemente de caráter econômico. Sendo assim, para se estabelecer o significado, de fato, dos eventos dentro da luta de classes, mais que se apoiar no sentido lógico do processo, é necessário observar seu conteúdo histórico completo, que é dado pelo interesse de classe dominante nestes.

 

No Brasil do pós-massacre da ditadura militar, em que tem curso o massacre do capital financeiro através da sua ditadura neoliberal, sob o simulacro do Estado do direito e da democracia burguesa, o sentido dos eventos econômicos e sociais são cada vez mais mesclados pelo caráter político e ideológico das classes em luta na sociedade. E este caráter político é dominado pelos interesses da classe burguesa. É claro que deste fato não se pode derivar também que todos os eventos que tomem lugar na sociedade sejam expressão única e exclusivamente da burguesia. Mas tendo em vista a situação concreta, em que sobre a organização histórica da classe operária, o Partido Comunista, recaiu toda a opressão do capital e das oligarquias burguesas durante as três décadas seguidas (60,70 e 80) de sua ditadura militar e ainda todo peso da crise do marxismo, decorrente da queda do campo socialista e da ex-URSS, os limites para que o conteúdo dos eventos políticos expressem os interesses de classe do proletariado são mais que lógicos, evidentes e concretos.

Um exemplo cabalístico destas limitações da representação de classe do proletariado dentro do quadro histórico do Brasil pode-se extrair tanto do conteúdo dos programas políticos que sustentam os partidos que se apresentam como representantes dos trabalhadores (PT, PC do B, PSTU...), como das próprias organizações operárias e sindicais existentes e atuantes (CUT, CGT, FS). Quem tomou conhecimento do programa apresentado pelo Partido dos Trabalhadores,diante da atual crise econômica, social e política não somente se surpreendeu com o caráter denominadamente conservador em termos de política econômica, em relação ao modelo capitalista no país, como ficou chocado com a linha programática de defesa e conservação das instituições burguesas e do status quo da classe dominante. Nenhuma palavra sobre revisão das privatizações criminosas; nenhuma palavra sobre o cancelamento dos acordos leoninos com o imperialismo; nenhuma palavra sobre limites ao "sagrado direito de herança ou propriedade privada"; nenhuma palavra concreta sobre pôr fim à farra do capital financeiro no país; somente um rosário de propostas assistencialistas e de atos de boas intenções. No tocante à defesa das instituições burguesas, o discurso do interesse de classe serve para justificar a manutenção de todas as atrocidades presentes na Constituição vigente.

 

Quanto aos outros partidos, seria uma total perda de tempo discutir seus programas aqui, visto que a própria tática dos mesmos compromete o caráter revolucionário destes, pois transformam o radicalismo de retórica ou a conciliação descarada em biombo para uma atuação prática revisionista e divisionista, que só atrasa o processo da revolução brasileira e a verdadeira organização revolucionária do proletariado em classe e partido político. E se as organizações que se dizem representar os interesses dos trabalhadores esgrimem propostas como as que se viu acima, imaginem agora as organizações operárias e sindicais dirigidas por estes partidos, e ainda as que estão sob o controle direto da burguesia? Claro que nestas organizações sempre há espaço para o contraditório entre as direções e suas bases, que na maioria é formada por operários ou trabalhadores em geral, conduzidos à luta por suas necessidades imediatas ou à ilusão na linha estratégica e retidão de suas lideranças. Também não se pode negar a sinceridade de muitas lideranças, mesmo equivocadas, ao acreditarem na correção das estratégias dos partidos pelegos a que estão afiliadas. Contudo, para além destas contradições, o que existe de fato é um tremendo fosso entre os interesses de classes do proletariado e as organizações e partidos existentes que hegemonizam sua luta na atualidade. E desta situação particular e concreta é que se constitui uma conjuntura política dominada por uma correlação de forças que transforma o processo eleitoral numa instância de renovação da legitimidade e representatividade do domínio de classe da burguesia sobre o proletariado; com isto, a reafirmação das instituições que regulam este processo: as leis burguesas, o voto secreto, o parlamento, o governo, etc; em síntese, o Estado burguês.

 

Diante deste fato, o desafio é: como desenvolver a luta de classes do proletariado, no atual quadro político nacional, sem que esta seja canalizada para afirmar os interesses de classe da burguesia dominantes na conjuntura - o processo eleitoral? Ao nosso ver, a melhor conduta não é cegar os olhos diante da realidade e dar curso a atividades ou lutas em que os objetivos gerais não se façam presentes, inteira e visivelmente, nos objetivos imediatos. Neste particular, quanto maior o hiato entre estes objetivos mais espaço de manobra existirá para o desvio destas atividades e lutas para o objetivo eleitoreiro. E assim, aos Comunistas Revolucionários se impõe a tarefa de conduzir a luta do proletariado prioritariamente para o objetivo organizativo e o seu fortalecimento ideológico através de atividades mais reflexivas e de compreensão da situação política geral e das condições da luta de classes na mesma. Naturalmente, isto não significa esquecer de atuar nas mobilizações e lutas espontâneas do proletariado por demandas imediatas e econômicas, ou ainda nas atividades de caráter político realizadas pelas organizações e partidos políticos reformistas. Neste caso, a ação dos comunistas é sempre elevar a luta à sua condição revolucionária e de ruptura, seja com o sistema e o governo neoliberal das oligarquias, seja com os partidos e lideranças reformistas e revisionistas presentes na mesma. Aqui age a nosso favor a conjuntura, pois ao precipitar o processo eleitoral burguês, criou uma contradição entre a conduta das lideranças dos partidos burgueses e reformistas e as necessidades emergentes das massas, que sofrem dia-a-dia com a fome, miséria, opressão e violência do sistema. E isto forma o espaço contraditório que permite o confronto entre as soluções para os movimentos das massas.

 

Mas, se manifesta uma contradição ainda maior no processo político atual precipitado pela crise do setor elétrico e a crise política do governo FHC: trata-se do fato de que tanto as forças mais conservadoras, da direita nacionalista, quanto as forças da oposição burguesa tomaram para si as bandeiras da solução da crise econômica e política da sociedade em contradição à política defendida pelo atual governo ditada pelo FMI. Neste caso, como romper com o imperialismo e sustentar um modelo de desenvolvimento capitalista independente? Claro que para a direita nacionalista, tudo se reduz à experiência nazista e fascista. Mas acontece que no quadro político e econômico nacional e internacional esta proposta é insustentável; por um lado, porque, para governar para os monopólios e capital financeiro, é necessário o apoio das massas; por outro, porque qualquer governo eleito pelas massas no Brasil terá um conteúdo antiimperialista. Alia-se a isso a baixa dos regimes sem o rótulo democrático no continente; mirem-se nos exemplos de Pinochet, Fujimori, Hugo Banzer, Strossner, Videla. Quanto a nós, comunistas, nossa contradição se situa em torno do problema subjetivo, ou seja, na ausência de uma organização revolucionária suficientemente forte e flexível para conduzir a luta direta pela revolução em todo o país, pois do ponto de vista objetivo, o socialismo científico é o único sistema capaz de subsistir ao capitalismo e sua crise.

 

Neste contexto, a realidade objetiva impulsiona toda a conjuntura para um desfecho político favorável aos trabalhadores. Por um lado, porque a inviabilidade das propostas da oposição burguesa e pequeno burguesa, mesmo vitoriosas nas urnas, ficarão visíveis frente às emergências das massas; e tão rapidamente, quanto mais rapidamente chegarem ao governo. Por outro lado, porque o imperialismo e a direita nacionalista tornarão um inferno o governo da oposição, elevando ao máximo as contradições com o movimento revolucionário numa situação similar à República de Weimar. Portanto, nossa tarefa é não se deixar abater, como os "Spartaquistas" - Karl Liebknecht e Rosa de Luxemburgo _ pelas armadilhas e traições da social-democracia e impulsionar o seu governo para o imediato desgaste político. Mas até lá, a luta agora é por defender o movimento operário do ataque eleitoreiro, desmascarar os agentes da reforma e do peleguismo e fazer avançar a luta e a organização do proletariado para condição revolucionária e independente.

 

Abaixo o governo podre das oligarquias!

Abaixo o revisionismo e o reformismo traiçoeiro!

Viva a organização e a luta independentes da classe operária!

Viva o Partido Comunista Marxista-Leninista!

P.I. Bvilla / pelo OC do PCML