Stiglitz: NOS BASTIDORES DO FMI - Parte 3

Texto de Joseph Stiglitz, Vice-presidente do Banco Mundial entre 1997 e 2000: "O que eu aprendi com a crise econômica mundial"

O que eu aprendi com a crise econômica mundial - 3ª parte

Texto de Joseph Stiglitz,
Vice-presidente do Banco Mundial entre 1997 e 2000

Eu não deveria estar tão surpreendido. O FMI gosta de ocupar-se dos assuntos sem estranhos que fazem demasiadas perguntas. Na teoria, o Fundo apóia as instituições democráticas nas nações que atende. Na prática, solapa o processo democrático mediante a imposição de políticas. Oficialmente, suponhamos, o FMI não impõe nada. Só “negocia” as condições para ajudar. Mas todo o poder nas negociações está de um lado, o do FMI, e este raras vezes concede suficiente tempo para conseguir um amplo consenso, inclusive para consultas extensas com o parlamento ou com a sociedade civil. Às vezes o FMI finge total transparência e negocia pactos secretos.

Quando o FMI decide ajudar a um país, despacha uma missão de economistas. Esses freqüentemente carecem de experiência suficiente sobre o país. O mais provável é que tenham maior conhecimento de primeira mão sobre seus hotéis de cinco estrelas do que dos povos que vivem na zona rural. Eles trabalham duro, absorvidos nos números até altas horas da noite. Mas sua tarefa é impossível. Em um período de dias, ou ainda, de semanas, estão encarregados de desenvolver um programa coerente que reflita as necessidades do país. Basta dizer que ruminar números poucas vezes proporciona o entendimento que precisa a estratégia de desenvolvimento para toda uma nação. Ainda pior, a ruminação de números nem sempre é boa. Os modelos matemáticos que o FMI usa freqüentemente são defeituosos ou antiquados. Os críticos acusam a instituição de enfocar a economia como se se tratasse de molde para fazer bolo e tem razão. Se sabe que equipes de trabalho para um país tem redigido livros de informação antes de visitá-lo. E existe uma história de um desafortunado incidente ocorrido quando os membros de uma equipe copiaram extensas partes do informe correspondente a um país e transportaram a sua totalidade para outro. Haviam conseguido seu propósito se a função “buscar e substituir” do seu processador de palavras não tivesse falhado, deixando o nome do primeiro país em algumas partes.

Não é justo dizer que os economistas do FMI não se importam com os cidadãos das nações em desenvolvimento. Mas os homens mais velhos que são maioria no Fundo, eles são predominantemente homens velhos, que atuam como se sobre seus ombros levassem a que Rudiard Kipling descobrisse como a carga do homem branco. Os especialistas do FMI acreditam sererem mais brilhantes, mais educados e de estarem menos motivados politicamente que os economistas dos países que visitam. De certo, os líderes econômicos desses países são bastante bons, em muitos casos mais brilhantes ou melhores que o pessoal do FMI, e muito freqüentemente integram estudantes de terceiro grau das universidades melhor qualificadas. (Com graduação na Universidade de Oxford, no MIT, na Universidade de Stanford, na Universidade de Yale, na Universidade de Priceton, e quase nunca o FMI teve êxito em recrutar os melhores estudantes). No último verão em um seminário na China sobre a política em relação às telecomunicações. Pelo menos três dos economistas chineses presentes no auditório fizeram perguntas tão complexas como as que fariam as melhores mentes do Ocidente.

Com o passar do tempo, minha frustração cresceu (Ainda que poderia pensar que já que o Banco Mundial estava contribuindo literalmente com bilhões de dólares com o pacote de socorro, sua voz seria escutada. Mas foi ignorada quase tão resolutamente como são as pessoas dos países afetados). O FMI sustentou que tudo o que se pedia aos países da Ásia Oriental era que equilibrassem seus orçamentos durante a recessão. A administração Clinton não havia tido que desenvolver uma grande batalha no Congresso para evitar uma reforma sobre o equilíbrio orçamentário neste país. E não foi o argumento claro dessa administração que frente a recessão , algum gasto deficitário poderia ser necessário. Está foi o que eu e maioria dos outros economistas temos ensinado a nossos alunos durante 60 anos. Com toda a franqueza, um estudante que desse a resposta do FMI a pergunta: “Qual deveria ser a postura fiscal da Tailândia para encarar uma crise econômica”; Seria reprovado com um zero.

Quando a crise se estendeu a Indonésia, me preocupei ainda mais. Uma nova investigação do Banco Mundial mostrava que a recessão em um país tão eticamente dividido poderia desencadear várias turbulências sociais e políticas. De modo que em fins de 1997, em uma reunião de ministros de finanças e diretores de bancos centrais celebrada em Kuala Lumpur, emitiu uma declaração que foi preparada cuidadosamente e foi revisada pelo Banco Mundial, que sugeriu que um programa monetário e fiscal excessivamente contracionista podia conduzir a perturbação política e social na Indonésia. Uma vez mais o FMI sustentou sua posição. O Diretor Administrativo do FMI, Michel Camdessus, repetiu ali o que havia dito em público: que na Ásia Oriental simplesmente teria que apertar os dentes como fez o México. Prosseguiu sua intervenção anotando que apesar do padecimento durante um curto prazo, o México teria se fortalecido dessa experiência.

 

Não perca  o próximo capítulo de “Nos Bastidores do FMI”;  desta lição ninguém esquece...