Stiglitz: NOS BASTIDORES DO FMI - Parte 2

Texto de Joseph Stiglitz, Vice-presidente do Banco Mundial entre 1997 e 2000: "O que eu aprendi com a crise econômica mundial"

O que eu aprendi com a crise econômica mundial

Texto de Joseph Stiglitz,
Vice-presidente do Banco Mundial entre 1997 e 2000

Penso que este foi um erro. Primeiramente, a diferença das nações latino-americanas, os países da Ásia Oriental já estavam manejando excedentes orçamentários. Na Tailândia, o governo operava com excedentes tão grandes que na realidade estava privando a economia dos tantos investimentos necessários em educação e infra-estrutura, essenciais para o crescimento econômico. E também as nações da Ásia Oriental já tinham rígidas políticas monetárias, a inflação era baixa e seguia caindo (na Coréia do Sul, por exemplo, a inflação se mantinha em 4%). O problema não era o governo imprudente, como na América Latina; o problema estava no setor privado imprudente. Todos aqueles banqueiros e empresários, por exemplo, que haviam apostado na bolha da propriedade de base.

 

Diante de tais circunstâncias temia-se que as medidas de austeridade não reavivassem as economias da Ásia Oriental sem que mergulhassem na recessão e inclusive na depressão geral. As elevadas taxas de juros poderiam aniquilar as empresas altamente endivida-das, ocasionando mais bancarrotas e insolvências. A redução do gasto governamental só contrairia mais a economia.

 

Por esta razão ainda que se advogue por uma mudança de política. Fale com Stanley Fischer, distinto ex-professor de Economia do Instituto de Tecnologia de Massachusetts(MIT) e ex-economista principal do Banco Mundial, que havia chegado a ser subdiretor administrativo do FMI. Me reuni com colegas economistas do Banco Mundial que podiam ter contato ou influência dentro do FMI, forçando a fazer tudo o que poderiam para que a burocracia desta instituição atuasse.

 

Convencer as pessoas do Banco Mundial em minha análise foi fácil, mas mudar as mentes no FMI foi impossível. Quando conversava com importantes funcionários do FMI, explicando, por exemplo, como as altas taxas de juros poderiam aumentar as bancarrotas, e com isso seria mais difícil restaurar a confiança nas economias dos países da Ásia Oriental, a princípio estiveram renitentes. Logo depois de fracassar ao trazer a colocação um real argumento contrário, eles recorreram a outra resposta: quem sabe eu entendesse a pressão proveniente da junta de diretores executivos do FMI, o organismo designado pelos ministros das finanças dos países desenvolvidos que aprova todos os empréstimos do Fundo.

O significado do que eles diziam era claro. A junta se inclinava a ser inclusive mais severa, enquanto esta gente personificava na realidade uma influência moderadora. Meus amigos, que eram diretores executivos, expressaram que quem estava sendo pressionado eram eles. O assunto era enlouquecedor, não simplesmente por causa da inércia do FMI, que era tão difícil acabar, sim porque, como tudo ocorrera nos bastidores, era impossível saber quem era o verdadeiro obstáculo para fazer a mudança. Era este particular que apressava aos diretores executivos, ou eram estes que apressavam o particular. A verdade certa, na verdade, eu não sei.

 

Obviamente, todos no FMI me asseguravam que seriam flexíveis: se suas políticas realmente resultassem demasiadamente restritivas, forçando as economias da Ásia Oriental a entrar em uma recessão mais profunda que a necessária, então as reverteriam. Escutar isto me produz calafrios. Uma das primeiras lições que os economistas ensinam aos seus estudantes universitários é a importância dos intervalos: uma mudança na política monetária (elevando ou baixando as taxas de juros) demora entre 12 a 18 meses para produzir plenos efeitos.

Quando eu trabalhava na Casa Branca como Presidente do Conselho de Assessores Econômicos, centramos toda a nossa energia em prognosticar onde estaria a economia no futuro, assim poderíamos saber que políticas recomendar hoje. Ignorar o que se passaria no futuro era como uma loucura. E isso era precisamente o que os funcionários do FMI se proporiam a fazer.


 

Não perca  o próximo capítulo de “Nos Bastidores do FMI”;  desta lição ninguém esquece...