FGTS: vamos politizar esta conversa?

Não se trata apenas de uma questão econômica de reposição de perdas por conta de “planos econômicos”

FGTS: vamos politizar esta conversa?

Por: João Fernandes / Secretaria Sindical do PCML


Sim, pois do jeito que a coisa vai, pode parecer que se trata apenas de uma questão econômica de reposição de perdas por conta de “planos econômicos”.  No governo de Getúlio Vargas, a Consolidação das Leis Trabalhistas veio para “brecar” o avanço das mobilizações operárias, tornando, inclusive, os sindicatos à sua imagem e semelhança, pelo atrelamento e subserviência.

O FGTS foi criado em 1966, portanto, em plena vigência da ditadura militar sob a batuta de Castelo Branco. E com que objetivos? Adequar a legislação trabalhista às mudanças estruturais em curso no Brasil em particular, a partir de 1964, e à reorganização do capitalismo ao nível mundial em geral. A estabilidade  no emprego representava um dado dificultador para o capital internacional investir no Brasil, tendo em vista a baixa rotatividade da mão de obra nesta legislação.

O “canto da sereia” do FGTS e as centrais


O FGTS veio para “permitir” a demissão dos trabalhadores mais idosos e engajados politicamente e a admissão, em proporções bem menores, de trabalhadores mais inexperientes e despolitizados e sem propensão à sindicalização; favorecer a rotatividade da força de trabalho e oferecer condições para maior acumulação.

O FGTS apresenta-se, então, como mais um instrumento ideológico com que a classe dominante ilude a classe operária, acenando com melhores condições de vida pela “indenização”(saque do FGTS) recebida quando da demissão e a possibilidade do trabalhador se transformar em pequeno empresário. Com isto, tornou os trabalhadores e seus sindicatos, reféns de sua política e incapazes de uma ação revolucionária de cujas conseqüências até hoje nos ressentimos.

Veja-se, por exemplo, a posição adotada pelas centrais sindicais no presente episódio da reposição das perdas do FGTS, valor que foi apropriado, indevidamente, pelos representantes das oligarquias.

As centrais estão caindo num grande engodo e levando consigo todos os trabalhadores, na medida em que despolitizam o debate e não aproveitam a desmoralização do governo em mais este episódio - até mesmo a CUT não participando do acordo, pois o motivo que a levou a se retirar  não teve uma fundamentação político-ideológica, mas sim econômica. A participação das outras Centrais é coerente com o seu nível de adesismo à classe dominante, sobejamente demonstrado em inúmeras outras ocasiões.

As propostas que fazem parte do acordo são ridículas e deixam claro o que este  governo pensa a respeito dos trabalhadores; os “representantes” dos trabalhadores não deveriam legitimá-las com a sua presença e participação nestas reuniões.

A bem da verdade, o comportamento do atual governo não difere do comportamento dos governos Sarney e Collor que expurgaram do FGTS as correções que hoje são reconhecidas como devidas ao trabalhador. O atual governo quanto ao Imposto de Renda, por exemplo, usa uma legislação que penaliza os trabalhadores e refresca aqueles que, efetivamente, têm renda e muita renda.

A CUT já deveria ter compreendido que sentar-se à mesa de negociação com este governo é aceitar o risco de ser arrastado para o lamaçal em que ele se encontra. Deveria ter compreendido, também,  que esta reposição do FGTS não reabilita, moralmente, a classe dominante, visto que é uma gota quando comparada com o que ela apropriou da produção da classe operária e com o grau de crueldade com que se submete e humilha todos os trabalhadores deste país.

Não basta a CUT, portanto, enquanto entidade reconhecidamente mais avançada, de lutas históricas, apenas afastar-se das negociações: há de denunciar os podres deste sistema e convocar os trabalhadores e seus aliados e tomar a iniciativa na organização de um amplo movimento de massas capaz de colocar de joelhos a arrogante e desmoralizada burguesia e recuperar não apenas as migalhas do FGTS, mas todos os direitos: o direito à saúde, alimentação, educação, cultura, lazer, trabalho, enfim, a viver sem exploradores e explorados.