Tá na Rua, tá na Lapa

Entrevista com Hamir Haddad, Diretor de teatro do "Grupo Tá na Rua" de teatro de rua

Tá na Rua, tá na Lapa


Entrevista com Hamir Haddad

Diretor de teatro - Grupo Tá na Rua


“As condições de vida cultural das pessoas já são tão difíceis. Você recebe um imóvel, investe, e de repente você ter que pagar um aluguel de mercado, é te obrigar a colocar ali atividades de mercado também. Então significa que ao invés de fazer meu trabalho, de trabalhar com a comunidade, com os adolescentes de baixa renda, de fazer teatro de rua, trabalhar em educação popular, pois eu trabalho com a casa aberta, faço festas e não cobro ingresso, tudo isso teria que ser transformado. Se vou ter que pagar o preço de mercado, vou ter que virar o “Ricardo Amaral” da Lapa. E a última coisa que a Lapa precisa é do Ricardo Amaral, ele é bom para a Zona Sul, Miami. Eu acho que a Lapa tem características especiais que podem e devem ser respeitadas.

Essa história de fazer pagarem preço de mercado por aluguel daquelas casas os grupos que receberam essas casas, por serem justamente os grupos que tem uma atividade cultural de extrema importância e que não têm condições de se manter, é inverter totalmente o sentido das coisas, é matar. Vai fazer mais um saneamento étnico e vai limpar; vai sanear e ficar bonito, e vai morrer. Há muitas políticas culturais que matam a cultura na nascença. E há uma insensibilidade muito grande, às vezes, dos órgãos, do Poder Público, em relação a essa questão cultural. Porque na verdade a maior parte deles nem tem convívio com isso, nem sabem direito do que se trata e nem dão muita importância, como se política e cultura fossem coisas inconciliáveis. Fico com medo dessa insensibilidade, desse atitude de provocar um aborto numa região que é essencial para o Rio de Janeiro, é uma região que tem a possibilidade de ser o centro cultural do Brasil. A Lapa vive uma efervescência cultural que nenhuma outra cidade do Brasil jamais teve ou terá.

Não pode virar um lugar para turista com alguns restaurantes caros, como foi feito no Pelourinho, e expulsar a população dali. Que os turistas venham ou que tragam gente no fim de semana, é a mistura democrática, é a qualidade étnica da coisa, é trabalhar com as diferenças. As pessoas saem do mundo inteiro para verem um lugar que não seja igual no mundo inteiro.



Tá na rua ensina teatro a menor carente e de rua



“Tá na Rua é um grupo de teatro de rua, temos esse nome porque fomos para a rua nos salvar, porque estávamos morrendo dentro das salas fechadas, servindo ao público que o golpe militar colocou dentro dos teatros, e atendendo às solicitações dos interesses militares. Então para não morrermos, fomos para a rua buscar a força popular para nos manter vivos. E mais ainda, nos deu uma visão da questão cultural muito mais ampla que um intelectual de classe média trancado nos seus guetos podia ter. Quando fomos para a rua descobrimos uma possibilidade enorme com a força popular.

A nossa escola é uma formação de artes, educação e cidadania, a gente faz questão de ter a questão da cidadania incluída no nome do meu trabalho, porque tudo que a gente faz passa por aí. Fazemos formações de atores, fazemos espetáculos de rua e de palco, e trabalhamos na área de educação popular com adolescentes de baixa renda, crianças, menores de rua... E não temos nenhum convênio até agora com nenhuma organização internacional. Eu falo isso para deixar claro que não sou mais um desses que estão ganhando dinheiro em nome dessas coisas. Aqui tem cultura? Tem sim, senhor...”