O Primeiro de Maio de 2014 em Curitiba

O Primeiro de Maio é uma data marcante. Ele pontua a luta social. Não pode ser esquecido. As conquistas dos trabalhadores, hoje desfrutadas como um regalo, exigiram espírito de sacrifício e renúncia ao longo de decênios.

O Primeiro de Maio é uma data marcante. Ele pontua a luta social. Não pode ser esquecido. As conquistas dos trabalhadores, hoje desfrutadas como um regalo, exigiram espírito de sacrifício e renúncia ao longo de decênios. Seja a redução da jornada de trabalho bem como condizentes garantias de bem estar no trabalho tipificaram bandeiras de reivindicações a no mínimo considerar humanas. Nada caiu como por um passe de mágica ou generosidade da burguesia. E, inclusive, as providências de assistência aos trabalhadores por concessão de benefícios coletivos e instituição de legislação protetora contribuíram até para elevar a produtividade do trabalho e o lucro do capital, à medida que as condições perversas de exploração atenuaram sobremaneira e permitiram que até o trabalho fosse melhor executado com rapidez e perfeição.

No século XIX, quando na Europa e Estados Unidos, vingava o capitalismo concorrencial em toda a sua crueza e plenipotência, dado que nesta etapa os capitais de pequenos foram se tornando cada vez maiores até alcançar a maturidade monopolista, havia luta sem trégua entre os próprios capitais em disputa pelo domínio de mercado, no qual se realiza o lucro do capital. Dominar o mercado é garantir a realização do lucro e a expansão do capital. Todavia, isto somente acontece quando os pequenos capitais se agigantam, eliminando uns aos outros e impondo-se pela força bruta. Aqueles que restam do confronto ganham escala de produção. Ganham o mundo. Nesta época, a exploração do trabalho era a mais flagrante, escandalosa, apontada com o dedo em riste. E inclusive os empresários capitalistas sentiram este rescaldo. Vezes e vezes, assassinaram-se por vingança em mortes sob encomenda uns contra os outros na disputa pela hegemonia dos capitais que comandavam. Provaram também o fel que fizeram outros seres humanos experimentarem.

Ora pois, esta data tão importante ostenta uma comemoração universal. Quase todos os países em que o capitalismo adquiriu certa desenvoltura celebram este dia. E, na província do Paraná, na comarca de Curitiba, também se exalta este dia. Todavia acontecem duas comemorações.

A primeira pertence ao sindicalismo reformador, imediatista, pobre de espírito, rico de afetação ignorante, alinhado com o capitalismo financeiro promovendo tal e qual programas de auditório para atrair as massas trabalhadoras empobrecidas e humildes com distribuição de prêmios e loterias, numa multidão quase sem noção do mundo que as acolhe e subjuga. Esta comemoração atraiu 80 mil pessoas na praça Nossa Senhora da Salete em frente ao Palácio do Governo. Lá estavam elas sequiosas de prêmios, na espera da sorte grande a fim de regressar para casa com algum cobiçado brinde.

A segunda reunia os trabalhadores mais conscientes do sindicalismo politizado e os revolucionários incansáveis. Os que repudiam favores, os que não precisam de esmolas por portarem uma consciência mais desenvolvida de serem os construtores materiais por meio de seu trabalho do mundo que nos cerca. Das calçadas, paralelepípedos e asfaltos de ruas e avenidas, transitando pelo automóveis, trens, caminhões e navios, a semeadura nos campos de plantio, até os computadores de última geração e equipamentos os mais sofisticados e sensíveis, milhões foram os anônimos trabalhadores que geraram os valores a se traduzir nas maravilhas que nossos olhos contemplam como frutos da engenhosidade do cérebro humano. O triste é que eles não se enxergam como criadores destas riquezas, tão fracionado está seu trabalho em milhares de minúsculas tarefas às vezes até distribuídas por uma produção planetária, que somente quando se agregam no artefato pronto evidenciam o enorme trabalho oculto de quem contribuiu de todas os lugares para construí-las. É assim. Este primeiro de maio consciente reuniu perto de 100 pessoas numa celebração religiosa na Igreja Senhor Bom Jesus na praça Rui Barbosa. Nem a CUT participou alegando outras atividades meritórias. Nem os partidos ditos de esquerda estavam lá desta vez. Ali estavam trabalhadores, padres progressistas, evangélicos críticos, movimentos minoritários e comunistas revolucionários, todos juntos na mais ínfima das minorias. Mas juntos e não envergonhados de sua consciência. Não somente os comunistas revolucionários edificam tijolo por tijolo a revolução. A revolução é obra da necessidade social e esta não é somente percebida pelos revolucionários.

Nesta celebração, a palavra foi aberta em frente ao altar. O jornal INVERTA se fez expressar. Desfraldou sua bandeira e externou com clareza seu ponto de vista. Foi ouvido e perguntado do local em podia ser comprado para leitura. Na hora de estar junto, nos dizeres do padre ao oficiar o casamento, na alegria e na tristeza, somente o INVERTA permaneceu. E por essa atitude perseverante, dele vieram perguntar. Mas, para além disso, foi importante escutar os interlocutores no uso da palavra, investigar seu sentimento e perceber sua razão, desfiada em argumentos. Extrair lição do que se dispunham a proferir. Revolucionários ou candidatos a tal postura não podem ser surdos a voz daqueles que querem lutar sinceramente embora ainda sem bem saber que armas empunhar.

As breves intervenções estavam muito focalizadas no desejo de justiça, na incompreensão dos chefes, no abuso do trabalho, na estupidez do trabalho escravo ainda grassante, na exploração do capitalismo, mas principalmente este último colocado de um modo com acentuada religiosidade, como se o capitalismo fosse espécie de encarnação maléfica. Artes do coisa ruim na qual só o inferno há de ganhar. Entrementes, era apontado com o dedo. Sabiam que era ele.

Nessas locuções espontâneas se mostrou clarividente a ausência de conhecimento de uma teoria com base em ciência social para penetrar na essência e natureza íntima do que é esse capitalismo. Proliferava a manifestação sincera. De coração puro e limpo. Porém, que mal se pergunte: o que é esse estranho ser social espalhado por toda a parte? Donde vem? Como age? Por que age? Como surgiu? Que trouxe de bom? Que trouxe de ruim? Em que há de resultar?

Era como se a classe trabalhadora precisasse ser reeducada. Enfrenta na prática do dia a dia um dito cujo monstro que não se sabe ao certo o que é. Sabe que existe. Que ora é ruim, ora é bom. Ora sopra labaredas como um dragão. Ora afaga, macio como a brisa do mar. Como fica essa contradição entre o bom e o ruim? Como ela se esclarece?

Estas tantas perguntas requestam alguém, um organismo de inteligência, capaz de exercer esta função educativa, de preparação, de conscientização e organização. Um organismo independente, fruto da luta dos trabalhadores. Esse é o papel de nosso jornal, o INVERTA. O papel de inverter a realidade do senso comum, trazer a consciência pela leitura e o estudo. Ensinar, debater, demonstrar que há uma refinada ciência para compreender o desenvolvimento da sociedade e propor-lhe lucidamente a transformação revolucionária. Sem isso, o força esmagadora do cotidiano vai reproduzir esse mesmo capitalismo e desacorçoar muitos daqueles que querem lutar.

A luta é longa, árdua, ingrata. Mas é a imposição do existir, a necessidade do viver.

 

José da Silveira Filho